A Vara do Trabalho de Óbidos condenou a empresa de navegação Transportes Bertolini Ltda a pagar R$ 10 milhões por […]

Transportes Bertolini é condenada a pagar R$ 10 milhões por naufrágio no Rio Amazonas que matou 9 pessoas

A Vara do Trabalho de Óbidos condenou a empresa de navegação Transportes Bertolini Ltda a pagar R$ 10 milhões por dano moral coletivo, após acidente, ocorrido em agosto de 2017, que atingiu 11 empregados da empresa, vitimando fatalmente 9 deles. A sentença foi proferida em ação civil pública de autoria do Ministério Público do Trabalho no Pará e Amapá (MPT), por meio da Procuradoria do Trabalho no município de Santarém, e manteve decisão liminar deferida em julho deste ano, determinando que a Bertolini cumpra medidas para a prevenção de acidentes de trabalho.

Segundo a sentença, a Bertolini deve instruir de forma apropriada e suficiente os empregados quanto às precauções a tomar para evitar acidentes de trabalho; manter em perfeito estado as condições de navegabilidade e de funcionamento de equipamentos como rádio, radar, sistemas de governo e propulsão, dentre outros, para propiciar segurança na navegação; e submeter trabalhadores habilitados a treinamento, qualificação, capacitação e reciclagem acerca das medidas previstas no Regulamento Internacional para Evitar Abalroamento no Mar (Ripeam).

Além disso, a empresa deve ministrar, anualmente, treinamentos específicos de precauções a tomar para evitar acidentes do trabalho, abordando procedimentos operacionais e de segurança da embarcação. Em caso de descumprimento, ficou estabelecida multa de R$ 5.000,00 por medida descumprida, reversível a instituição a ser posteriormente indicada.

Em 2017, o MPT instaurou o Inquérito Civil nº 000182.2017.08.003/5 que apurou a ocorrência de irregularidades que contribuíram para o acidente de trabalho decorrente da colisão entre o navio mercante Mercosul Santos e um empurrador de balsa de armação, da Bertolini. O empurrador naufragou no Rio Amazonas, nas proximidades do município de Óbidos. O MPT chegou a propor a assinatura de Termo de Ajuste de Conduta (TAC) à empresa a fim de sanar extrajudicialmente as irregularidades constatadas no inquérito. A Bertolini não aceitou a proposta, não restando alternativa senão o ajuizamento de ação civil pública à Justiça do Trabalho.

Entenda o caso

O Ministério Público do Pará em Óbidos, ofereceu denúncia contra dois responsáveis do navio Mercosul Santos, cujo choque com um empurrador da empresa Bertolini, no dia 2 de agosto de 2017, levou ao naufrágio da embarcação e morte de nove tripulantes que estavam no empurrador E/M TBL CXX, no rio Amazonas, nas proximidades de Óbidos. Após 4 meses, no dia 12 de dezembro de 2017, os nove corpos foram encontrados dentro do empurrador, em complexa operação de içamento. A denúncia foi ajuizada no último dia 27 de julho.

O MPPA elaborou a denúncia com base nos elementos de informação colhidos em procedimento investigatório criminal, no qual foram inquiridas testemunhas, oficiados aos órgãos que atuaram no resgate, bem como em inquérito da Marinha e da delegacia. A promotoria denunciou Nilson Raimundo da Cruz e Flávio Vinicius Lins Barbosa, respectivamente, o imediato e o prático da embarcação Mercosul Santos.

De acordo com o MP, no dia 2 de agosto de 2017, os denunciados agiram na modalidade culposa de imprudência, por não observarem as medidas de precaução e segurança da navegação, todas previstas no Regulamento Internacional para Evitar Abalroamentos no Mar (Ripeam-72).

As medidas incluem manobra “roda a roda” (proa com proa), redução de velocidade, emissão de sinais sonoros, iluminação com o holofote e respeito à preferência de embarcação. Dessa forma, proporcionaram risco concreto ao Navio Mercosul Santos, da empresa Mercosul Line, e ao comboio composto por nove balsas graneleiras acopladas ao empurrador E/M TBL CXX, da empresa Bertolini Ltda., ocasionando o naufrágio dessa embarcação, e morte de nove pessoas (Dick Farney de Oliveira Costa, Dárcio Vânio Rego de Sena, Carlos Eduardo Bueno de Sousa, Cleber Rodrigo Azevedo, Ivan Furtado da Gama, Walndel Ferreira de Castro, Juraci dos Santos Brito, Adriano Sarmento de Castro e Marcelo Reis Moreira Costa). Dois tripulantes sobreviveram.

Os dois integrantes do navio foram denunciados pela prática do crime previsto no art. 261 do Código Penal: “expor a perigo embarcação ou aeronave própria ou alheia, ou praticar qualquer ato tendente a impedir ou dificultar navegação marítima, fluvial ou aérea”. Com a agravante do resultado morte por culpa, em concurso de agentes, todos previstos na forma do artigo 70 do Código Penal – concurso formal de crimes: “Quando o agente, mediante uma só ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplica-se-lhe a mais grave das penas cabíveis ou, se iguais, somente uma delas, mas aumentada, em qualquer caso, de um sexto até metade”.

A promotoria requereu também a expedição de oficio à Capitania Fluvial de Santarém, em havendo condenação administrativa, a suspensão do certificado de habilitação do prático Flávio Vinicius Lins Barbosa e do imediato Nilson Raimundo da Cruz.

A denúncia do MPPA relata os acontecimentos que culminaram no abalroamento (choque) entre o navio e o empurrador, iniciados às 5h39 da madrugada do dia 2 de agosto, nas proximidades da Costa do Alvarenga, no rio Amazonas, em Óbidos. O comboio, que media 215 metros de comprimento, vinha baixando o rio em rota normal, e o navio Mercosul Santos, com 225 metros de comprimento, subia o rio Amazonas, também pelo mesmo canal de navegação.

Choque, naufrágio e morte

Com o choque o empurrador afundou totalmente, cerca de 15 quilômetros baixando o rio, em frente à comunidade São Lázaro. As buscas foram iniciadas por meio do Corpo de Bombeiros, bem como as investigações para apurar as causas do acidente. A empresa Bertolini apresentou a empresa holandesa SMIT para executar o plano de içamento do empurrador E/M TBL CXX.

A Cábrea Taklift 7 (guindaste flutuante) chegou no dia 16 de novembro de 2017 e iniciou o plano, executando o içamento total do empurrador no dia 05 de dezembro de 2017. No dia seguinte, após 21 dias de operação, os nove corpos até então desaparecidos foram todos encontrados dentro do empurrador, identificados posteriormente por meio de perícia forense.

De acordo com a apuração, os dois denunciados estavam de serviço no momento dos fatos. As conversas gravadas revelam que em certa altura, avistaram uma embarcação de passeio no radar, que depois seguiu seu rumo. Em seguida, detectaram “outra, muito maior aqui na nossa proa”, que era comboio com o empurrador da Bertolini.

Porém, ficou comprovado nos diálogos que o denunciado Flávio Vinícius pensou estar falando com o comando do E/M TBL CXX – que estava logo à frente, quando na verdade falava com o empurrador Dom Francisco VI– que estava bem mais distante. As duas embarcações estavam baixando o Rio Amazonas.

Gilson Eloy, do empurrador Dom Francisco VI, combina a manobra “bombordo com bombordo”, e emissão de holofotes. Enquanto isso, no empurrador TBL CXX, testemunhas contam que ouviram Carlos Eduardo Bueno de Sousa, conhecido como “Paulista”, morto no naufrágio, que estava na condução, dizer no canal 16 (chamada geral para pedido de socorro, emergências), “esse navio tá doido, esse navio tá doido, esse navio tá doido”, e chamou pelo navio por três vezes. O Mercosul não mudou de curso e nem diminuiu a velocidade.

O MP relata que aos quatro minutos e vinte e quatro segundos antes do abalroamento, os denunciados notaram o empurrador TBL CXX a cerca de 3.240 metros, havendo um espaço de tempo e de distância suficiente para a realização de manobra “roda a roda” (proa com proa), que evitaria a colisão, emissão de sinais sonoros e iluminação com o holofote.

Depois do acidente, na sequência, o comandante do navio, oficial José Bento Soares Neto, que estava dormindo em seu horário de descanso, após acordar com o abalroamento, assumiu a manobra do navio e determinou que uma equipe arriasse um bote para procurar sobreviventes.

A denúncia contém todos os diálogos, imagens de radar e demais elementos que levaram o MPPA a concluir que por todas as provas, “os indícios de autoria são robustos e a materialidade inquestionável”, cuja extensão do dano resultou na morte das nove vítimas.

 

*Com informações de assessoria

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